sexta-feira, 31 de outubro de 2008

O método de estudo bíblico de A. W. Pink

"Nos meus primeiros anos eu assiduamente segui este triplo caminho:

  • Em primeiro lugar, eu lia toda a Bíblia três vezes por ano (oito capítulos do Antigo Testamento, e dois do Novo Testamento diariamente). Eu constantemente perseverei nisso durante dez anos, a fim de me familiarizar com o conteúdo, que só pode ser alcançado através de consecutivas leituras.

  • Em segundo lugar, eu estudei uma porção da Bíblia a cada semana, concentrando-me por dez minutos (ou mais) todo dia na mesma passagem, pensando na ordem dela, na ligação entre cada afirmação, buscando uma definição dos termos importantes, olhando todas as referências marginais, procurando seu significado típico.

  • Terceiro, eu meditei sobre um versículo a cada dia, escrevendo-o sobre um pedaço de papel na parte da manhã, memorizando-o, consultando-o em alguns momentos ao longo do dia; pensando separadamente em cada palavra, pedindo a Deus para revelar para mim o seu significado espiritual e para escrevê-la no meu coração. O versículo era o meu alimento para aquele dia. Meditação é para a leitura como a mastigação é para o comer.
Quanto mais alguém seguir o método acima mais deve ser capaz de dizer:
'A tua palavra é lâmpada que ilumina os meus passos e luz que clareia o meu caminho' Sl 119: 105'"
- A. W. Pink, em Reformed Voices
Traduzido e publicado originalmente por: Vinícius Pimentel

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

A construção da cosmovisão cristã / Jonas Madureira

Palestra de Jonas Madureira (teológo e mestre em filosofia - PUC-SP) no 6º Congresso de Teologia Vida Nova

Origem Etimológica e Contexto Originário do Termo “Cosmovisão”

A palavra “cosmovisão” é tradução do inglês worldview. Esta, por sua vez, é tradução da palavra alemã Weltanschauung. Welt- significa “mundo”; -anschauung: “apreensão”, “percepção”, “intuição” de mundo. A origem desse termo está na filosofia alemã, e foi cunhado pelo filósofo alemão Wilhelm Dilthey (1833-1911). Em sua obra Tipos de cosmovisão e sua figuração nos sistemas metafísicos (1911), Dilthey afirma que “toda a cosmovisão é uma estrutura complexa fundada sobre a base de uma imagem de mundo que determina a significação e o sentido da vida”[1].

Breve Definição de “Cosmovisão”

Trata-se de toda base e estrutura de significação, compreensão e interpretação do kósmos, isto é, do mundo em que vivemos (Lebenswelt). Nesse caso, temos a semente do conceito de cosmovisão já no De Anima de Aristóteles, quando o Estagirita diz que a “alma nada conhece sem a mediação das imagens (phántasmata)” [431a14]. Ou seja, todo o conhecimento do mundo, das coisas que estão no mundo, de Deus, de nós mesmos, do outro etc., se dá pela mediação das imagens que produzimos como resultado da “apreensão”, “percepção”, “intuição” das coisas conhecidas. Isso é assim tanto para filósofos tão distintos, como Platão e Aristóteles, quanto para teólogos que viveram em realidades tão distantes, como Agostinho e Tomás de Aquino.

Cosmovisão e Finitude

O fato de o conhecimento ter que ser mediado por imagens, i.e., por “visões de mundo”, revela o caráter finito do conhecimento humano. Ou seja, a mediação da “cosmovisão” indica a impossibilidade do ser humano apreender diretamente (imediatamente) a realidade. Não somente isso. A mediação das imagens (cosmovisões) implica um conhecimento parcial e não total da realidade. Isso era indiscutível tanto no contexto filosófico da antigüidade como em todo o medievo (Platão, Aristóteles, Plotino, Agostinho, Boécio, Anselmo, Abelardo, Tomás, Scotus, Ockam). Porém, a modernidade — representada por Descartes, Kant e todo o idealismo filosófico que vigorou até o final do século XIX, e que ainda hoje tem influenciado a vida de muitos de nós ocidentais — estabeleceu uma nova base e estrutura para o desenvolvimento da epistemologia (teoria do conhecimento). Trata-se das filosofias do sujeito (cogito de Descartes, “sujeito transcendental” de Kant).

Ao contrário do pensamento antigo-medieval, o idealismo filosófico moderno pressupõe a possibilidade do conhecimento total da realidade. E a base e estrutura desse conhecimento estão no sujeito, que, por sua vez, resiste a toda “dúvida metódica” (epoché, “colocar entre parênteses”) e a toda necessidade de fundamentação do conhecimento a posteriori (conhecimento que não é universal nem necessário, i.e., que se deriva da experiência). O resultado disso é a noção de que o sujeito é universal (o cogito é uno; não existem “sujeitos transcendentais”), e só tem acesso imediato à suas representações. Isso marca uma mudança no processo de conhecimento. O sujeito que conhece não mais apreende o mundo, e forma a partir dessa apreensão uma visão de mundo (base e estrutura de conhecimento antigo-medieval). Agora, o sujeito transcendental constrói o mundo, i.e., elabora a sua visão da realidade. Assim, o único mundo que é cognoscível é aquele que se tornou produto das representações construídas pelo sujeito. Em suma, (1) não apreendemos mais a realidade; (2) a coisa-em-si torna-se incognoscível; e (3) a realidade do mundo é colocada em “suspenso”. Ou seja, perdemos o acesso ao mundo real pela negação da possibilidade de apreendê-lo. O que nos resta é apenas o mundo construído por nosso psiquismo.

Somente no final do século XIX, com o desgaste e a crítica dos idealismos modernos, é que se voltou a cogitar um retorno da noção de “apreensão da realidade”, porém sem os malabarismos metafísicos tão marcadamente presentes no pensamento antigo-medieval. É nesse contexto de desgaste e crítica dos idealismos que surge o conceito de “cosmovisão”. Portanto, o termo “cosmovisão”, pelo menos originalmente, acolhe a esperança de recuperação de uma base e estrutura de apreensão do conhecimento humano. [Que não se confunda “base e estrutura de apreensão” com “base empírica”!].

Cosmovisão como Base e Estrutura Epistemológicas

Como vimos, “cosmovisão” implica “apreensão” e “mediação”. Isso significa que o conhecimento que temos ou podemos ter das coisas tem sua base e estrutura na capacidade que temos de apreender o mundo em que vivemos. Não somente isso, pois o que conhecemos é apreendido conforme uma determinada base e estrutura. Ou seja, todo ser humano, seja quem for, seja onde estiver, conhece a realidade em que vive a partir de uma determinada base e estrutura de conhecimento. Isso é o que define o caráter mediador das cosmovisões ou imagens que formamos a partir da apreensão das coisas que conhecemos parcialmente.
Cosmovisão, Teologia e Proclamação

Nossas teologias são mediações de nosso conhecimento de Deus. Isso significa que elas são elaboradas sob a base e a estrutura de nossa “visão de mundo”, i.e., de nossa “apreensão da realidade”. Como mediações, as teologias estão sob a marca da finitude. Ou seja, elas não são apreensões plenas da realidade (i.e., “totalizantes”). Como mediações, as teologias são sempre parciais. Esse caráter parcial de nossas teologias está presente nas Escrituras e especialmente em Paulo: “Porque agora vemos como por um espelho, de modo obscuro, mas depois veremos face a face. Agora conheço em parte, mas depois conhecerei plenamente, assim como também sou plenamente conhecido” (1Co 13.12, A21). Nossas afirmações teológicas sobre Deus, ainda que sejam corretas, ainda que sejam absolutamente verdadeiras, ainda assim refletem uma visão parcial da nossa realidade e da realidade de Deus. É preciso entender que qualquer compreensão da “revelação que em parte conhecemos” depende de uma base e estrutura epistemológicas que são determinantes em nossa interpretação das Escrituras, da realidade de Deus, dos seres humanos, do mundo etc. Não queremos com isso defender a necessidade de criarmos um critério de verificação da validade lógica ou da veracidade de nossas proposições teológicas. Não está em jogo saber qual teologia é certa, qual é a errada. O que está em jogo é a consciência de que sempre que fazemos teologia somos atravessados por nossas visões de mundo. E que isso tem fortes implicações em nossa tarefa de proclamação do Reino de Deus. Somos os portadores da Palavra. Isso nos coloca diante do desafio de fazer com que a proclamação seja ouvida. E isso não é feito sem a mediação de nossas cosmovisões e teologias.

Sugestão de Leitura

AGOSTINHO. Confissões. São Paulo: Paulus, [Livro X].
ARISTÓTELES. De Anima (Livros I-III). Campinas: IFCH/UNICAMP, [431a17].
TOMÁS DE AQUINO. Suma de Teologia. 1ª Parte, Q. 84-89. Uberlândia: EDUFU, [Q. 84, a.7].
MADUREIRA, Jonas. Filosofia. São Paulo: Edições Vida Nova, [p. 63-78].

[1] DILTHEY, W. Die Typen der Weltanschauung und ihre Ausbildung in den metaphysischen Systemen. Berlin: Reichl, 1911, p. 45.

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

2º Palestra - "Fé e conhecimento" / Dr. Merold Westphal, ph.D.

Segue abaixo os príncipais pontos da 2º palestra do Dr. Merold Westphal na Universidade Mackenzie-SP (22/10).

O que é fé?

Para Mark Twain a "fé consiste em acreditar naquilo que você sabe que não é assim". Isto significa que a fé é uma crença ilógica na ocorrência do improvável. Estas concepções de fé, como algo antagônico ao verdadeiro saber, tem suas origens em Platão. Segundo este filósofo grego, a fé é uma tentativa fatal de alcançar o conhecimento. Crenças tal como realidades experimentais e sensoriais nunca chegam ao nível do verdadeiro e imutável conhecimento. A palavra usado por Platão para este conceito de fé, é a palavra grega pistis, algo parecido com opinião. E é o máximo que podemos alcançar com os sentidos, a opinião (pistis). A idéia geral de que a fé é uma tentativa fracassada de conhecimento.

Para Dr. Merold Westphal, a fe é uma confiança em um Deus pessoal, em suas promessas e mandamentos. O NT também faz uso da palavra pistis, todavia com sentido complemente diferente de Platão. Pistis no NT é uma confiança real em um Ser pessoal (Hb.11.1). Segundo Merold, existe um risco cognitivo na fé, porque a certeza não é garantida ela visão (II Co 5.7). - A definição de fé, segundo Merold, é pautada pela cosmovisão bíblica.

É unânime que apareça as seguintes perguntas: Fé é conhecimento falho? Somente a filosofia pode nos aproximar do verdadeiro conhecimento conforme o conceito platônico?

O que é a razão?

De acordo com o projeto do Iluminismo, a razão dá as garantias que a fé não provém. A razão é a base para crença e prática. E ainda, promove a tolerância tão vilipendiada pelo autoritarismo religioso. Razão nestes moldes, então, passa a ser a religião universal revelada pela razão e não revelação. Isto significa que cada ser deve ser livre para averiguar a verdade.

Este projeto universalizante e pacificador não deu certo. Primeiro porque promoveu um Reino de Terror (Ex: comunismo soviético e revolução francesa) e segundo, porque o nome "razão" se tornou um conceito extramente contráditório como mostra os séculos posteriores, onde a razão foi elaborado de formas diametralmente opostas. A razão se tornou símbolo do pluralismo. Os conceitos racíonais de Spinoza, kant, Hegel (sec 16,17 e 19) são totalmente diferentes tal como judaísmo, cristianismo e islã.

Dr. Merold argumenta que a razão, segundo revela seu desenvolvimento histórico, se tornou uma fé particular sem garantia. Ele acredita que tudo depende dos pressupostos que temos trazido conosco, uma vez que a razão nunca está isenta de pressupostos.

Aonde Dr. Merold quer chegar? Devemo apelas a intuição na busca da verdade? Devemos ser abitrários em nossas escollhas?

Para Merold, toda fé, seja ela religiosa ou "racional", envolve riscos cognitivos. Dr. Merold sugere que em todas escolhas de nossa mente existe o aspecto volitivo. Não é uma questão puramente teórica, uma vez que não somos máquinas pensantes abstratas. Quando começamos a pensar sobre algo, estamos em algum lugar e não em lugar nenhum (vácuo).

A fé com dádiva

- Não é produto humano, mas uma conversação de um Deus amoroso.
- Deus está ativamente envolvido no nascimento da fé (Ef 2.8). Ele infunde em nós a verdade.
- Porque nem todos tem fé? Dr. Merold responde: Não sei!

Para Dr. Merold na questão que envolve a fé, a oração exerce um aspecto central e na razão, ela não tem espaço.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Congresso "Filosofia e Cristianismo" na Univ. Mackenzie / Dr. Merold Westphal




A primeria palestra com o prof. da Fordham University - New York, Dr. Merold Westphal (mestre e ph.d. em filosofia pela Yale University) foi breve e direta. No auditório Rui Barbosa da Universidade Mackenzie, Dr. Merold versou sobre o tema "Os usos religiosos de ateísmo moderno".

Segue abaixo a sinopse da palestra:


Ateísmo por definição é a negação do teísmo (principalmente o teísmo monoteísta). O teísmo tradicional cristão afirma que Deus é um criador pessoal, doador da lei moral e um salvador misericordioso. Logo, o atéismo nega estas proposições e proclama a ausência deste ser.


O que entendemos quando falamos em Deus pessoal?

- Um agente e não simplesmente uma causa.
- Realizador de atos de linguagem como promessas e mandamentos.
- Realizador de atos de justiça, misericórida e amor.


Ateísmo pré-filosófico - é a ausência de um Deus pessoal, mas sem uma negação explícita. Não é um sisteme filosófico bem delineado. (Algo como o agnósticismo). Não é impossível que Deus exisa, mas ele não deve existir. Neste caso, não há um explicação racional, é apenas uma preferência cosmovisionária.


Atéismo filosófico - diferentemente do ateísmo pré-filosófico, envolve uma reflexão racional sobre esta crença. É também chamado de ateísmo evidencialista.
- O ateísmo evidencialista com referência a verdade, busca evidências para justificar a negação do ser de Deus. E por outro lado, declara insuficientes as evidências que justificam o teísmo.
- O ateísmo evidencialista com referência a racionalidade, declara que são insuficientes os argumentos teístas que procuram torná-lo uma crença irracional. E por outro lado, declara que os argumentos que tornam o teísmo irracional são suficientes.

Ateísmo de suspeição

O principal foco do Dr. Merold não foi exatamente o "ateísmo filosófico", mas o ateísmo de suspeição ou suspeita. De acordo com Dr. Merold, este sistema pode ser considerado como um auto-engano, pois não é avaliado de acordo com os princípios que norteam a lógica. São simplesmente aceitos por seus expoentes sem avaliação racional, que parecem querer dizer: "Cremos no que cremos porque queremos crêr nisso!" Obviamente, existe interesses nisso, sejam eles individuais ou sociais. Os principais teóricos desta corrente são: Marx, Freud e Nietzsche.

1) Freud - a religiosidade é como sonho ou desejos disfarçados. É uma realização da mente humana que busca na religião; proteção contra os enigmas da morte, juízo contra opressão, preenchimento da falta de afeto paternal e meios para deerminados fins.

2) Marx - a religião está ligada a "história das classes e idéias dominantes". Para Marx, qualquer sistema de idéias (política, filosófica, econômica, social, etc.) deriva de suas força/utilidade e não de sua veracidade. Chama-se isso de ideologia. Todavia, Marx estabelece que a ideologia deve legitimizar aspectos sociais para ter seu valor, e obviamente, a religião não tinha. Isto significa que para Marx, a religião é um forma de exploração que traz alívio a consciência do opressor e neutraliza a revolta do crédulo. Por isso a máxima que diz "a religião é o ópio do povo".

3) Nietzsche - A religião tem origem na "revolta dos escravos" e no ressentimento dos escravos contra os senhores. Isto explica o surgimento do preconceito moral, uma vez que os escravos faziam dos senhores, os "maus", e por exclusão, eles mesmos se tornavam os "bons" (auto-afirmação/superioridade moral).

Estas propostas ateístas e teóricas acimaIquerem demonstar que a visão teísta é rudimentar. Um sistema mental que busca a realização de desejos escondidos, manipulação social e a auto-afirmação (negação do outro).

Como responder, de acordo com Dr. Merold? (Em nenhum momento Dr. Merold defendeu que seus argumentos são invencíveis). Para este estudioso, eles podem ser classificados como; 1) argumentos pouco convicentes, 2) argumentos não tão bons, e 3) melhor argumento.

1) Pouco convicente (Falácia genética).

- É falacioso pressupor que a crença é injustificável apenas porque existe problemas com os crentes. Segundo Merold, parece ser recusa em reconhecer a verdade daquilo que a suspeição desconfia.
- Ataque tu quoque - qualquer argumento corta os dois lados. Se para Freud a crença religiosa é infantil porque busca a figura de um Pai, então a teoria de Freud não passa de uma crença adolescente. Isto é, a recusa adolescente em reconhecer um autoridade superior.

2) Argumento não tão bom.

-A argumentação ateísta não reflete toda a história, é parcial. Exemplo: No USA usaram a telogia para justificar atos racistas, mas também foi usada como a base do abolicionismo e dos direitos civis.

3) Melhor resposta.

-Reconhecer a verdade da crítica da suspeição e usá-las para auto-exame.
-Muitas críticas tem sua origem em textos bíblicos de orientação profética e não no ateísmo moderno. Para Dr. Merold, Marx foi uma grande plagiador de Amós, Oséias, Isaias, Jesus e Tiago, uma vez que todos estes eram críticos sociais. Nietzsche diz que sua crítica é semelhante a crítica de Jesus aos fariseus. Freud diz que a psicanálise e a religião concordam que somos fracos.
- Viver piedosamente e trabalhar para sanar os erros encontrados pelos ateísmo. Neste caso, o melhor argumento é a própria vida do cristão.

Soli Deo Gloria

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Apologética cristã, quem precisa disto? William L. Craig


Tradução & créditos: Vitor Grando (despertaibereanos.blogspot.com)


"Ao viajar, eu também tenho encontrado outras pessoas que me disseram como elas deixaram de apostatar por ter lido um livro apologético ou visto o vídeo de um debate. No caso delas a apologética foi um meio através do qual Deus as fez perseverar na fé. Agora, é claro, a apologética não pode garantir a perseverança, mas pode ajudar e em alguns casos, pela providência de Deus, ser até necessária. Recentemente eu tive o privilégio de falar na Universidade de Princeton sobre argumentos para a existência de Deus, e após minha preleção eu fui abordado por um jovem que queria falar comigo. Claramente segurando as lágrimas, ele me disse que há poucos anos atrás ele vinha lutando com dúvidas e estava prestes a abandonar sua fé. Alguém lhe deu um vídeo de um dos meus debates. Ele disse "Isso me salvou de perder a fé. Eu não posso te agradecer o bastante."


Eu disse, "Foi o Senhor que lhe salvou de cair".


"Sim", ele respondeu, "mas Ele te usou. Eu não posso te agradecer o bastante". Eu lhe disse o quão emocionado eu estava por ele e lhe pergunta sobre seus planos futuros. "Eu estou me graduando esse ano", ele me disse, "e eu planejo ir para o seminário. Eu vou ser pastor." Glória a Deus pela vitória na vida desse homem!"

sábado, 4 de outubro de 2008

I Pe 3.19 - Jesus desceu ao inferno? (Parte 3) / Daniel Grubba

Terceira teoria: Proclamar vitória aos poderes das trevas

Uma terceira posição, é a de que Jesus, entre sua morte e ressurreição foi a inferno. Porém, a diferença é que esta suposta viagem metafísica não foi planejada com a intenção de oferecer segunda chance aos penitentes, tampouco libertar santos do AT, mas apenas para proclamar uma mensagem de vitória aos poderes do maligno. Esta teoria é tão popular quanto a anterior (libertar santos do AT).
Para Norman Geisler e Ron Rhodes, os espíritos em prisão “eram seres não salvos, devem ter sido anjos ao invés de seres humanos[1]”. Robert H. Gundry (Ph.D. em Estudos do Novo Testamento pela Manchester University) diz que “a pregação de Cristo aos espíritos em prisão mui provavelmente significa que Cristo desceu seu espírito ao hades, a fim de proclamar Seu triunfo sobre os espíritos demoníacos que ali haviam sido acorrentados por Deus[2]”. Roger Stronstad, editor do Comentário Bíblico Pentecostal, afirma que Jesus em virtude de sua morte, foi até os anjos aprisionados e anunciou sua vitória sobre a morte e as conseqüências de seu triunfo, isto é de que julgamento já estava selado[3].
Esta posição está fundamentalmente baseada em uma análise léxico-sintática de I Pe 3.19. Como já vimos este versículo diz que Cristo “foi e pregou aos espíritos em prisão” (NVI). E o que chama a atenção dos estudiosos desta sentença é o verbo pregar. A análise revela que Pedro usa propositalmente a expressão original grega kerussõ (khru,sow) que significa: “ser arauto”, ou em geral, “proclamar”[4]. Este termo é diferente de outra expressão grega euangelizõ (euvaggeli,zw), que significa pregar ou evangelizar (no sentido de dar oportunidade de escolha), que quase sempre é usado acerca das “boas novas” relativas ao Filho de Deus, conforme são proclamadas no Evangelho[5]. Neste contexto a melhor tradução bíblica em português de I Pe 3.19 é a KJA[6] que diz: “no qual igualmente foi e proclamou aos espíritos em prisão”.

Tomar as chaves da morte, inferno e Satanás.

É muito comum ouvirmos em pregações, principalmente quando o tema é batalha espiritual, uma expressão que diz: “Satanás é tão pobre que nem a chave de sua casa (inferno) ele tem mais”. Esta expressão popular[7] está intimamente associada com a idéia da ida de Cristo ao inferno. Muitos entendem que Jesus em sua rápida passagem pelo inferno proclamou a vitória da redenção, e de quebra tomou das mãos de Satanás as chaves do inferno e da morte.
Devemos mais uma vez rejeitar esta posição alegórica, pois o texto de I Pe 3.19 não diz isto claramente. E os versículos que tratam das chaves da morte e do inferno, nenhum, absolutamente, associa estas chaves como pertencentes a Satanás. “Somente o Senhor possui as chaves da morte e do inferno. Ninguém mais!” [8] Esta soberania está explicita em textos como Mt. 16.19, que diz que a chaves do reino dos céus foi entregue por Jesus aos apóstolos. E também em Ap. 1.18, texto em que o próprio Jesus declara que as chaves da morte e do hades (NVI) pertencem a ele. Em nenhum momento Jesus diz foi ao inferno (ou até mesmo a bíblia), e precisou roubar as chaves das mãos de Satanás, uma vez que este ser angelical nunca as teve em suas mãos[9].

Proclamar vitória aos anjos caídos

Segundo os expoentes desta teoria, a pregação aos espíritos, não é às “boas novas” propriamente dita, mas o ato de Jesus proclamar Sua vitória aos espíritos dos anjos caídos[10]. Com isso, eles querem dizer, que os “espíritos em prisão que há muito desobedeceram [...] enquanto a arca era construída” (NVI) são os filhos de Deus de Gn.6.2. Declara-se que os “filhos de Deus” eram anjos caídos, assim como em Jó 1.6 e 2.1 que (segundo se declara) abandonaram seu estado propriamente dito (espiritual) e se casaram com mulheres nos tempos de Noé[11] (Gn 6.1-4). Portanto, sugerem que Cristo foi proclamar vitória a estes anjos caídos da época de Noé[12].
Sobre isto devemos dizer esta idéia está mais baseada em mitos da literatura apócrifa apocalíptica judaica[13] do que na Bíblia, pois em Mt 22.30, Jesus diz que anjos não se casam. Um outro ponto fraco desta interpretação é que o contexto maior de I Pe 3 destaca pessoas hostis (I Pe 3.14,16) e não demônios, ou anjos caídos. E mesmo que o texto indicasse que eram demônios, exatamente de onde os leitores de Pedro encontrariam a idéia de que os anjos pecaram “enquanto se preparava a arca (I Pe 3.20)? Não há nada disso na história a respeito da construção da arca em Genesis[14].
De fato, como acabamos de ver, estas interpretações propostas são bem interessantes, mas algumas contradições irreparáveis as prejudicam. Wayne Grudem após analisar esta tese (proclamar vitória aos poderes das trevas) conclui:
Os leitores de Pedro teriam de se submeter a um processo de raciocínio incrivelmente complicado para chegar a essa conclusão, já que Pedro não ensina isso de modo explicito. [15]

[1] Norman Geisler e Ron Rhodes, Resposta às seitas, p. 411.
[2] Robert H. Gundry, Panorama do Novo Testamento, p. 394.
[3] Roger Stronstad comentando I Pe 3.19 no Comentário Bíblico Pentecostal, p. 1718.
[4] De acordo com o Dicionário VINE, p. 891. Ele diz que o verbo ekeryxen significa; proclamar uma mensagem, da parte de um rei ou potentado. (Ver também; Gleason Archer, em Enciclopédia de temas bíblicos, p. 356).
[5] Dicionário VINE, p.891.
[6] A nota textual de rodapé da KJA (King James Atualizada) explica que este tipo de pregação foi uma proclamação vitoriosa realizada por Jesus sobre o inimigo e toda a malignidade do universo (2 Pe 2.4-5; Cl 2.15).
[7] O grupo musical de louvor, Diante do trono ajudou a popularizar esta posição através da música “A vitória da Cruz”, composta por Ana Paula Valadão Bessa e gravada ao vivo no Parque da Gameleira (BH) em Jul/2000. A estrofe mais significativa para nosso trabalho diz: “O Leão de Judá pisou bem forte e os esmagou, Tomou as chaves das mãos do diabo, Abriu minas cadeias e me resgatou”. De fato é uma linda poesia inspirada, resta-nos saber se é biblicamente correta.
[8] Franklin Ferreira & Alan Myatt, Teologia Sistemática, uma analise histórica, bíblica e apologética para o contexto atual, p. 620. Citação tirada pelos autores do livro de Heber Carlos de Campos, “Descenti ad Inferna”, p.126-127.
[9] É importante observar que o conceito de chaves em Ap. 1.18 está associado ao controle absoluto de Deus sobre a vida e sobre a morte. Outros textos corroboram com intensidade este conceito (Dt. 32.39; I Sm 2.6; Jo 5.21).
[10] Dicionário VINE, p. 892.
[11] Outras explicações menos lendárias devem ser analisadas e preferidas. Em outros contextos “filhos de Deus” muitas vezes se referem a seres humanos, embora em contextos diferentes (Dt. 14.1; 32.5; Sl 73.15; Is 43.6; Lc 3.38; IJo 3.1). Uma possibilidade válida é que “filhos de Deus” se refere a homens piedosos, descendentes de Sete e “filhas dos homens” se refere a mulheres pecaminosas da linhagem ímpia de Caim. Mais detalhes em Nota Textual de Gn 6.2, da Bíblia de Estudo NVI, p. 15.
[12] É assim que interpreta o texto David H. Stern. Ele diz: Os espíritos aprisionados são os anjos que pecaram (2 ped 2:4) e não mantiveram sua autoridade originaria (judas 6). Isto é, eles são “filhos de Deus ou filhos dos anjos), também chamados nefilim (caídos), que caíram de sua própria esfera, o céu para a terra, e “vendo (...) que as filhas dos homens eram formosas, tomaram para si mulheres” nos dias de Noach (Gênesis 6:2-4). Mais detalhes em Comentário Judaico do Novo Testamento, p. 820-821.
[13] O livro apócrifo de I Enoque ( datado de 165 a.C. a 90 d.C.) defende a idéia mostra como os anos caídos coabitaram com as filhas dos homens que geraram uma raça monstruosa de gigantes (I Enoque 7.1;15.1;86.1). Segundos o relato (15.1), esses gigantes forma destruídos pelo Dilúvio, mas seus epíritos foram deixados soltos como demônios para corromper todo gênero humano. (David, S. Russel, Entre o AT e o NT, p.103.)
[14] Wayne Grudem, Teologia Sistemática, p. 493.
[15] Idem, p. 493.